A primeira vez que estive em Veneza foi em 2008 e, como toda marinheira de primeira viagem, levei malas enormes e pesadas. Quando você tem pouca experiência com viagens costuma ter dificuldade em diferenciar o essencial do supérfluo e acaba consumindo alguns excessos. Ao chegar em Veneza, me deparei com muitas escadas, que separavam os canais das estreitas ruas. Não havia carros e nenhum outro meio de transporte. Era você com você. Eu pagaria o preço que fosse para que alguém me ajudasse com aquelas malas que, no inverno, tornavam o percurso mais difícil.
Esta semana estive na Bahia e visitei Morro de São Paulo, uma vila situada na ilha de Tinharé, Munícipio de Cairú e me lembrei do episódio em Veneza, dessa vez com uma mala muito pequena, 10kg. O acesso pode ser feito de várias formas. Seja como for, exige certa paciência e uma boa dose de bom humor, o que, diga-se de passagem, não falta ao povo baiano. Particularmente me encanta a forma leve que o baiano vive a vida. Não há aquele peso no rosto que costumamos ver em alguns grandes centros, muitas vezes pela rotina e alto fluxo de carros. Apesar dos desafios e dificuldades do cotidiano eu vejo um povo alegre e que sabe celebrar a vida.
Na vila o "transporte" utilizado, caso você não queira carregar sua mala pelas inúmeras ladeiras que percorrem as cinco praias localizadas em Morro de São Paulo é o carrinho de mão, carinhosamente apelidado de "Uber" e "Taxi". Então, assim que você desembarca é possível ouvir os gritos de oferta:
Vai querer UBER?
TAXI?
Vai pra onde?
Bora de Uber?
O valor é tabelado:
10 reais cada mala pequena
15 reais cada mala média
20 reais cada mala grande
Os profissionais que oferecem o serviço são credenciados por uma Associação local e costumam carregar entre 4 e 7 malas em uma única "viagem". Há vários profissionais e de forma ordenada prestam o serviço. Não há tumulto ou barganhas. Você chega e, como em uma fila de taxi, é atendido.
Como adoro conversar, aproveitei o trajeto até a terceira praia, onde estava hospedada, cerca de 25 minutos do porto, para conversar com Alvino, filho de pescador, nascido e criado na vila. Segundo ele, há muita demanda e costuma fazer entre 5 e 7 "viagens" por dia. Como não queria seguir a profissão do pai, resolveu trabalhar no "Uber".
Dono de um bom humor incrível, compartilhou muitas histórias e, a medida que avançava, imitando um som estrondoso de buzina, ia abrindo espaço na pequena rua compartilhada com turistas, comerciantes e cachorros.
Lições aprendidas:
Se quiser se diferenciar no mundo, tenha visão de negócio e desenvolva a capacidade de criar e inovar com as ferramentas que possui. Pare de esperar melhores condições para fazer algo que gere valor à sua vida e a vida de outras pessoas.
Tenha senso de coletivo. Ninguém faz nada sozinho, ninguém cresce sozinho, ninguém brilha sozinho. Faça parte de um grupo que possua os mesmos interesses e intenções. Mais do que nunca precisamos ter senso de comunidade e ajudar uns aos outros. Perceba, tem lugar para todo mundo, mesmo que você viva em uma ilha.
Essas pessoas poderiam seguir por anos e anos lamentando uma série de fatores, mas encontraram uma forma de gerar receita, serem produtivas e ofertarem um serviço que, para muitos, pode ser irrelevante, desnecessário e pouco valorizado. Mas experimente subir aquelas ladeiras, em uma temperatura de 40 graus, carregando uma mala, após 4 horas de viagem intercalada entre barco, carro e lancha. Você não só paga, como agradece imensamente por aquele serviço existir. Se uma ilha, com pouco mais de 4000 habitantes, diariamente se reinventa, empreende e gera negócio o que te impede de começar a sua carreira ou negócio agora? Lembre-se um serviço ou carreira surge da demanda. Se você tem a capacidade de observar o cenário e identificar as oportunidades você é capaz de gerar valor. Portanto, "enquanto uns choram outros vendem lenços". É assim que profissionais se posicionam no mundo, ontem, hoje e sempre.
Com carinho,
Simara Rodrigues
Revisado por Pâmela Mezzomo
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